quarta-feira, agosto 03, 2005

O maremoto

um maremoto repentino passou por aqui. me pegou de surpresa, me acertou em cheio. me jogou contra as pedras. lutei contra a força da água. eu não posso me afogar, não nessas águas. tentei pensar e ao mesmo tempo nadar. 30 segundos debaixo d'água, sem respirar. somente o som da arrebentação acima da minha cabeça, espuma e sal. agonia. bato os braços em vão. perdi os sentidos e já não sei por onde devo tentar escapar. 1 minuto. não aguento muito mais que isso. estou sozinho nessa batalha, pra variar. mesmo com o sal corroendo minhas retinas, abro bem os olhos e enxergo o que deveria ser o sol. ah, é por alí! estou exausto mas não posso desistir. ah! o ar! e mais ondas. o maremoto é sério, é violento e perspicaz. ainda não acabou. uma bateria de ondas me sacode, me afunda. volto à superfície. respiro, soluço e volto a ser alvejado. sou engolido e cospido para longe. branco.
devo ter me agarrado a algum lugar seguro e adormecido por um tempo. estava fraco. agora, então, não tenho adjetivos para minha fadiga. o mar parece calmo e a praia mais limpa. o maremoto lavou as areias do meu litoral. levou embora muita coisa que já deveria ter sido esquecida. o som do mar me agrada, me canta uma melodia há muito esquecida. choro. permaneço deitado e agora observo o céu. azul, poucas nuvens. acho que finalmente tudo acabou. esboço um sorriso tímido que ganha coragem aos poucos. agora ele é audível, sonoro, gostoso. infantil. eu precisava deste maremoto para voltar a viver. enfrentar a grande tormenta para enfim sair vitorioso. devo aproveitar a calmaria. ela se foi, pra sempre.
mesmo não querendo me levantar, apoiei-me sobre meus cotovelos e estalei meu pescoço. num impulso, estava de pé, sentindo o vento em meu rosto. o bom vento vespertino! altivo, me despedi do mar, agora como um espelho aos meus pés. hesitei em agradecê-lo, mas o fiz. em silêncio.
finalmente encontro-me em mim, acordado, despido de ilusões e sentimentos platônicos. não quero criar expectativas, apesar de me sentir restaurado. não quero ser vítima de um outro desastre repentino. citando Pedro Juan Gutiérrez: "a expectativa destrói muitas coisas. porém aprender a escapar dela é uma arte". e assim eu sigo.

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